Terá o ciclo de violência alguma vez fim? O projeto de Monitorização de Homicídios Trans da TGEU ultrapassa 5.000 casos
Os homicídios de pessoas trans permanecem em níveis alarmantes à medida que pautas transfóbicas se estabelecem mundialmente e posições anti-direitos se espalham. As atuais leis e regulamentações falham em abordar a violência contra pessoas trans.
Marcando o início da Semana de Consciencialização Trans de 2024, indo de encontro com o Dia da Memória Trans a 20 de Novembro, a TGEU- Trans Europa e Ásia Central – lança a atualização anual do seu projecto global de Monitorização de Homicídio Trans. Esta iniciativa de pesquisa monitoriza os homicídios de pessoas trans e de género diverso globalmente, documentando casos desde 2008.
350 pessoas trans e de género diverso foram registadas como assassinadas desde a atualização de 2023. Este é um aumento significativo em comparação com o ano anterior, em que 321 casos foram registados. Esta informação confirma o que a comunidade trans tem dito- a violência transfóbica não está de forma alguma a diminuir, muito pelo contrário, está a aumentar, sustentada por um crescente discurso de ódio anti-trans. Este ano, o Projecto de Monitorização de Homícidio Trans documentou um dos maiores números de homicídios desde o início de 2008.
Seguindo tendências anteriores, a América Latina e as Caraíbas registam mais uma vez o maior número de homicídios de todas as regiões no mundo, representando a 70% dos assassinatos de pessoas trans a nível global. Os dados continuam a indicar tendências consternantes no que diz respeito à intersecção da misoginia, do racismo, da xenofobia e da putofobia. A maior parte das vítimas foram mulheres trans negras e racializadas, e trabalhadoras do sexo de género trans.
Em relação ao número total de assassinatos deste ano, a Declaração Conjunta pela TGEU, desenvolvida em colaboração com a GATE, ILGA World, APTN, IGLYO, e ESWA declara:
‘Isto é sem dúvida a consequência de esforços céleres de movimentos anti-género e anti-direitos que instrumentalizam e vilificam pessoas trans de forma a impulsionar pautas políticas anti-democráticas mais abrangentes. Temos visto uma subida consistente nos níveis de discurso de ódio online e offline, especialmente por parte de atores políticos, líderes de fé ou religião, como também de figuras públicas. Este aumento é permitido pela falta de uma forte legislação de crime de ódio que proteja a identidade de género e de expressão, e a desinformação manipulativa fruto da falta de responsabilização de companhias de redes sociais em assegurar integridade informativa.’ – A declaração conjunta completa será publicada no Dia da Memória Trans, a 20 de Novembro.
Principais conclusões
Dados da Monitorização de Homicídio Trans de 2024 revelam:
– 350 pessoas trans e de género diverso foram registadas como assassinadas entre 1 de Outubro de 2023 e 30 de Setembro de 2024.
– Este ano, o número total de assassinatos registados ultrapassou os 5,000 casos desde que a TGEU iniciou a monitorização em 2008.
– Em consistência com anos anteriores, 94% dos homicídios registados foram femicídios, ou seja, as vítimas foram mulheres trans ou pessoas trans femininas.
– Trabalhadoris do sexo permanecem o grupo mais atingido de todas as profissões conhecidas. No entanto, a proporção de trabalhadoris do sexo entre as vítimas (46%) encontra-se no seu nível mais baixo desde que a nossa monitorização começou (2016: 62; 2008: 84%).
- 93% dos assassinatos registados foram de Pessoas Negras ou Racializadas trans, um aumento desde o ano anterior de 14%.
- Um terço das vítimas de assassinato registadas tinham entre 31 e 40 anos de idade, e um quarto delas entre os 19 e 25 anos de idade.
- 15 jovens trans menores de 18 (quase 6% do total) foram assassinades.
- Quase três-quartos (73%) de todos os assassinatos registados foram cometidos na América Latina e Caraíbas. Pelo 17º ano consecutivo, o Brasil lidera no ranking dos países, com 30% da totalidade dos casos.
- Nove casos foram registados em África durante este período de monitorização, mais do dobro que o total anual anterior mais alto desde o início do projeto (quatro em 2012).
- Houveram metade da quantidade de casos na Europa este ano em comparação com o ano anterior (2024: 8, 2023: 16); enquanto que nos Estados Unidos o número de casos aumentou (2024:41; 2023:31).
- Quase metade dos homicídios registados (46%) foram a tiro. Mais de um quarto (34%) dos assassinatos registados foram cometidos na rua e quase um quarto (22%) na casa da própria vítima.
Subnotificado e mal notificado: As realidades da violência contra as comunidades trans
Estes valores oferecem somente um breve vislumbre da situação atual. Muitos dos casos permanecem não registados ou mal informados devido a atribuição errada de género, e casos que habitualmente são denunciados atraem mínima atenção. Inclusivamente, esta atenção frequentemente diverge de como as vítimas desejam ser reconhecidas e tratadas.
Apesar da consciência dos desafios enfrentados por pessoas trans e a marginalização de comunidades trans estar a crescer, a violência contra pessoas trans, persiste.O total deste ano é o terceiro número mais alto de assassinatos registados desde que começámos a monitorizar em 2008, igualando o total de 2020. O número de assassinatos registados só foi maior em atualização de dados em 2021 (375), 2017 (369) e 2020 (350).
Os dados da Monitorização de Assassinato Trans não recolhem todos os casos registados globalmente, já que nem todas as vítimas de assassinato trans e de género diverso são assim reconhecidas em tais registos de óbito. Consequentemente, estes valores devem ser interpretados dentro dos contextos sociais, políticos, económicos e históricos em que ocorrem.
O elevado número de registos de assassinato na América Latina e nas Caraíbas é em parte devido à presença de sistemas de monitorização bem estabelecidos nestas regiões. A maior parte dos dados provêem de países com robustas redes de organizações trans e LGBTI que lidam com a monitorização. Contudo, este não é o caso em muitos outros países. Por esse motivo, é provável que um maior número de pessoas trans foram mortas do que as que o Projecto de Monitorização de Homicídio Trans reuniu. Em parte como resultado da expansão dos esforços de monitorização por nossa parte, este ano, foram registados pela primeira vez casos em Burkina Faso, Costa de Marfim, Namíbia, Nigéria e Síria na história inteira da Monitorização de Homicídio Trans.
“Todos os anos, a TGEU compila os dados de assassinatos trans a nível global para apurar o quanto vidas trans encontram-se significativamente em maior risco que outras pessoas. Este ano, enquanto confrontamos o sério marco de 5,000 assassinatos registados do qual temos conhecimento desde o início do projeto de Monitorização de Homicídio Trans, nós, as pessoas trans e comunidades em todo o mundo, estamos exaustes de repetidamente perguntar:
Quando terminará esta violência?
Não nos podemos dar ao luxo de continuar à espera!
Governos precisam comprometer-se a acção imediata para combater o surto de discurso e ataque de ódio anti-trans e quebrar com este ciclo de violência!
“As nossas vidas dependem disso!” diz Ymania Brown, Directora Executiva da TGEU- Trans Europe and Central Asia [Trans Europa e Ásia Central].
Mais informações
Nomes, países, dados demográficos, tipo de homicídio, fontes:
- Table Oct 2023 – Sep 2024 (pdf)
- Namelist Oct 2023 – Sep 2024 (pdf)
- Namelist Oct 2023 – Sep 2024 (xlsx)
Namelist Oct 2023 – Sep 2024 (csv) - Mapa Jan – Set 2024
- Mapa 2008 – Set 2024
Colaboradores
- Asociación de Derechos Humanos Cozumel Trans (Honduras)
- Asociación Silueta X (Ecuador)
- Association Unity (Togo)
- Caribe afirmativo (Colombia)
- Centro de Apoyo a las Identidades Trans (Mexico)
- HOPE- Have Only POsitive Expectations (Pakistan)
- Iranti (South Africa)
- Jinsiangu (Kenya)
- LakanBini Trans Network (The Philippines)
- Observatorio de violaciones a derechos humanos de personas LGTBIQ+ en Nicaragua
- (Nicaragua)
- OTRANS Guatemala (Guatemala)
- Rede Trans Brasil (Brazil)
Red SinViolenciaLGBTI (Latin America and the Caribbean) - SPoD (Turkey)
- Tranz Network Uganda (Uganda)